Estamos em Construçao.

Eu sabia que eu deixar para depois contar os detalhes da Birmania, do Laos e da Tailandia deixava mais dificil. Já que minha memória é falha e mais coisa vai acontecendo. Já estou em Sao Paulo e já fui no hospital para fazer ressonância e eletrô, e agora só me falta ver Dra Karen e a Dra. Euthymia. 

Na melhor das hipoteses meu exame nao dá nada, ná pior dá outra inflamaçao. Tanto faz qual seja o resultado. Num eu nao tenho que ser internada para tomar cortisona mais uma vez, e no outro eu nao preciso. O que sei é que  imunosupressor eu nao quero tomar mais. Agora tenho a experiência, e mesmo com todos os riscos de pegar tudo eu fui para o sudeste Asiático sozinha e andei todas aquelas montanhas de Kalaw as vezes até descalça.


 
Comi comida local das pessoas, aprendi comer com a mao e descansar depois. Sentar no chão e absolutamente NUNCA me senti mal.



No dia que eu conheci o Min Min ele me levou para ver os templos debaixo da terra. A cada dia eu ia ficando mais forte, e com Min Min mais cheia de informaçao. E sei que no prmeiro dia eu andava de sapato de andar em montanha aberto e preso. Milhoes de esparadrapos e de repeten sempre chovia, e colocavamos nossos casacos de chuva. 


Ele me pedia desculpas da chuva e eu dizia a ele que nada podia ser verde daquele jeito sem chuva. E eu ia andando e de repente resolvi por o pé em algo que achei bem sólido. Era cocô 🙂 Eu tive um acesso de riso. E ele veio me ajudar a limpar o pé na casa de uma senhora. Eu disse para ele que se aquilo havia de pior no dia, o dia era muito bom. 

Ele entao ele me contou que era crença deles, nao sei se do Nepal ou Myanmar… Que quando um pássaro faz cocô  em vc, ou vc pisa no cocô  só pode ser boa sorte.

No dia seguinte ele me imprestou um sapato mais confortável. E eu o usei uns 3 dias. No quarto eu disse que agora eu já conhecia bem aqueles lados e eu ia de chinelo.  E ele disse que se chovesse arrebentava o chinelo na lama.  E eu contei que eu tinha subido na Colômbia de chinelo.

E eu disse que nesse caso, de chuva,  eu andaria descalça mas chega de sapato. Eu quero pisar na terra. O Min Min já me conhecia, sabia que nao havia a menor chance de eu ter um ataque de chilique por causa disso. 

Choveu andei com prazer na lama e enfiei meu pé no lago e então o sangue-suga e gruda grudou no meu pé. Tiramos e aí começa a sair sangue. Mim mim vai buscar erva para estancar.  E me pergunta no que estou pensando.

“Min min coitado desse sangue suga , pega um sangue cheio de cortisona .”

Ele riu. E eu juro que até achei bom o sangue suga me deixar ver meu sangue vermelho sair. Vermelho bonito. Fiquei impressionada que a planta estancava. Impressionada pelo tanto que Mim Mim sabia.

E lá fomos nós. Dessa vez eu tinha até  conseguido arrumar  uma Americana muito gente boa para ser mais uma turista e contribuinte . Eu não queria dividir o valor queria que ela pagasse inteiro e eu também por saber que os preços estavam inflacionando com essa nova “democracia” . Seu aluguel já tinha dobrado e era época baixa de turismo. Época de chuva.


Ela tinha abandonado sua vida nos EUA e fazia 2,5 anos que morava lá na Tailândia onde tinha feito um curso de ser instrutora de mergulho. 

Explicou que sua mae trabalhava para o mercado financeiro e que o sistema que a dava muito dinheiro dia após dia a fazia ter mais divididas  para de repente, de um dia para o outro, a mandar embora e ter um divórcio dos pais. 

Ela ia me explicar e se justificar estar fora do seu país, de nao ter planos de voltar, mas eu disse de cara. “Nao precisa me explicar. Eu amo a Asia, nunca fui nacionalista, vejo similaridades e diferença até numa família e é isso é o mundo” 

Deve ser porque fui criada em escolhinha em ingles, depois o Lyceee Frances, com 12 na Argentina, 15 na Austalia, 19 em NY para faculdade, depois um ano na holanda para resolucao de conflito, depois mestrado e principio de doutorado na Inglaterra, pesquisa na Palestina e Israel. E já que todas as minhas viagens de verão acabaram sendo para a Ásia.

Tanto nos EUA, como no UK. Eles vendem summer camp e vc que é aluno mesmo tem no verão  uns 4 meses de férias. Ou seja, é tempo demais com chance demais de poder ir para outro lado. 

Também expliquei que meus pais são casados e acham que o mundo a cada dia esta pior para ter filho. Ou seja, nunca quiseram ter netos, aliás nem se meter em dar esse conselhos. Portanto cresci assim. Ninguém nunca falou de ser mãe , dona de casa , nem nada disso. 

 Ela naturalmente, sentiu-se confortável de me contar que tinha uma vida perfeita na Tailândia. Ela era instrutora de mergulho. O tempo era maravilhoso, e para renovar o visto tinha que fazer viagens ali pelo sudeste asiatico. 

Sua mãe mae a apoiava pois via que ela tinha se enfiado de tal forma no sistema que era presa, mas sua filha nao era, e nem devia ser. 

Conheci muitos pelo mundo que vivem assim, meio em transit, já instalados em outros países, de famílias pelo mundo e entendo que issso nos faz muito diferentes porque auqelas frases “Sinto tanta falta da comida da minha casa, o natal,que saudade do suco sei lá do que”Nunca passam na minha cabeça. 

A minha vida me fez assim, todas as pessoas que são parte da minha vida não estão no mesmo lugar.  
Minha amiga mais de infância, a Paula, sempre foi minha amiga assim. Sempre será. Sabendo que eu não moro aqui muito tempo. Sei que nos momentos cruciais independente do que passa na sua vida ela me liga, me visita e aparece até num país que estou. E eu ligo para ela.


Enfim, sei que foi assim, que quando o Temer entra, quando isso se instala eu prefiro cair fora do Brasil. Falei para o Andé que nunca tinha morado fora “Vamos mudar para o Irã?”E ele colocou na caixa de pandora de trabaho fora e disse que tudo bem podíamos ir.E nao é que eu tenho que estar no hospital e chegam possibilidades de emprego fora. 

Não tem Irã, mas das que tem, meu amorzinho me diz que eu que escolho. E eu escolhi o Peru, eu só conheço Cuzco e Machu Pichu e tem tanta coisa para aprender e ver.

O André me perguntou se ainda queria ir. E eu dentro do hospital comprei minha passagem para ir Birmânia  e disse para ele ir que iria quando voltasse.

 O André mudou para o Peru e eu fui para Birmania e agora só me falta esse resultado de exame. E na quarta eu descubro se tenho que tomar mais cortisona. Ou seja, pode ser que mais uma vez eu seja internada, prefiro que isso não aconteça  mas confesso que nem ligo muito porque eu me sinto muito bem, como da ultima vez e depois  então tomando ou nao tomando eu parto.

Agora na hora que saí de Mandalay, eu entrei num café e usei meu pouco burmes. Fiz as moças rirem. Tomei suco e tinha tanto dinheiro que tomei café expresso. Ouvi ocidentais falarem mal do café e achei que tudo era bom. 

Eu peguei todo meu resto de Kyat ( a moeda deles) e dei as  moças. Como sempre elas me disseram nao. E eu expliquei que eu estava indo embora e que eu nao ia agora voltar para Birmania.  Elas me agradeceram muito e eu fui embora. E quando estava lá na fila ouço meu nome.  “Julieta. Sua carteira.”

Na minha carteira não tinha dinheiro, nem cartão, só tinha papeis de anotações. Eu gostava dela porque eh minha simples carteira da Tailândia de anos e anos atrás. E essa moça cruzou aquele aeroportinho e foi me procurar por saber meu nome. 

Por saber que eu nem tinha ligado de dar todo o resto do meu dinheiro, que eu prefiri dar que comprar mil coisas , do que guardar para a volta, porque sabia que para eles era de fato mais útil. E não é que aquela moça pensou que eu deveria querer os meus pequenos recados, e a carteira. 

Essa é a Birmânia para mim. O país que me resgata sempre de perder qualquer coisa. O lugar onde as pessoas se esforçam para te trazerem o que mais tem valor para você a sua esperança na humanidade.

A genrente que me dá a Tamei de Chan, com o moço que dirige muito tempo para me dar meus óculos que eu esqueci. E que não aceita nada além de obrigada.


A minha Tailandia é Isaan, é Nong Khai, é a Mut Mee.  Eu até conheço todos os outros lados da Tailândia. Mas para mim a minha casa na Asia é lá. 

Na hora de ir embora Thia e Noy vem comido carregando a minha tralha para me dizer adeus. Para me dizer que me esperam nesse dezembro. A Yong me traz de presente um Tiger Balm feito pelos monges. 


É a Pao, o Julian, o Benny. As três irmãs da massagem. É o por do sol.

Vejo o melhor de mim e do mundo, por um mes, e o pior em um dia de volta. Tudo bem. Essa é a vida.  

Chego em casa e aqui está minha avó. Ansiosa mas que jamais pediria para alguém não ser quem é. E eu insisto para ela também andar. O que seria da minha vida sem a minha avó que não pede nada, que te ensina que dar significa se desvincular do que deu. Aceitar os outros como são. 

Ela resolveu comer pastel dos asiáticos daqui e não se esquece de levar para Netinha e Nininha. E eu quero tomar um expresso. Nós adoramos expresso aqui em casa sem açucar. Compro no aeroporto de  Bangkok, Abu Dhabi e Sao Paulo. Quando chego em casa eu nem acho bom o expresso daqui.

 

Vou com a  netinha no supermercado  e conto.
“Sabe que lá na Tailândia eles tomam café com gelo e leite de moça?”
“Nossa, e você toma esse?você que gosta de cafe forte e amargo?.”
“As vezes eu tomo, mas eu gosto do que o que eu inventei. Lá no Julian nao tem café expresso. Tem nescafé. Pó de chocolate, açucar, e chá de gengibre. E eu coloco tudo no meu cafe. Agua quente, café, chocolate, chá de ervas e muito gengibre e açucar.”

Pois é, sei que eu fui no supermercado e comprei nescafé que era contra minha filosofia de vida, um nescau, chá de gengibre mais gengibre puro porque imaginava que não se comparava e joguei açucar.

 Na hora que eu fiz todo mundo rir. Ainda mais na primeira tentativa com pimenta.

Mas na última eu me senti feliz. Pensei que a vida é assim tão impermanente. Que pode acolher tudo e nada ao mesmo tempo. Que aquelas memórias só ficam quando nos fechamos para o novo.

O resto é uma adequação do que temos para que fique o melhor que podemos. E no fundo nada disso nada mais é que ser aberto para o mundo. Nada mais é que aceitarmos que estamos em processo de construção .

 

 

 

 

 

 

 

 

5 thoughts on “Estamos em Construçao.

    • Obrigada Irene. Nao sei se é corajoso, ou irresponsável. Sem dúvida alguma é um auto privilégio esse de poder tentar. Tem muitos que dizem que o Dr. Getulio devia ter feito um angiograma antes para ver que é vasculite cerebral. Já eu. eu dou graças a deus que Dr/ Getulio pensou que podia ser mas nao quis fazer o exame porque era invasivo e nem eu dava toda a informacao. Eu tinha medo. No entanto, se nao fosse por todos esses anos da duvida, eu nao teria perdido medo do hospital, e nem teria ido para tantos lados do mundo. Na duvida, sobrou a possibilidade da vida. E só assim que agora todo segundo tem valor. Sinto-me extremamente privilegiada por nao ter sido colocada numa “box”que viria carregada de medos, inseguranças, e de meia vida.

    • Muito legal o seu relato, Ju! Você voltou com uma energia tão boa, que tenho certeza que o resultado dos seus exames não vão dar nada. bjs,

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