Estou no topo de uma Montana. Num restaurante aberto e vejo flores e montanhas e tomo chá. Faz neblina e eu as vezo , como as gotas, vejo com prazer. Não faz calor, não faz frio e às micro gotas mantém tudo isso tão verde.
Kimanhê tem 21 anos e faz 5 horas que estamos andando e conversando. Na verdade ele fala bem inglês. E a minha impressão de que tudo se transforma pelo respeito fica ainda mais forte hoje.
Foi agora buscar comida nesse restaurante, onde estamos que fica no topo da montanha e o restaurante ainda é Indiano. E eu já paro de escrever para conversar e comer com ele. Escrevo o resto do hotel.
De fato parei sentei, falamos e comemos. Chapatis com sei lá oque. Estava muito bom. E mangas doces e banana e tomei mais chá.
Andamos por plantações de gengibre , laranja, arroz, e tantas outras coisas que estavam ali naquelas belas montanhas. E das quais ele foi me contando.
Passamos por dois vilarejos e ainda vi mais lugares budistas, pequenos aprendizes de budismo. A árvore que Kimanhê me explicou era a árvore Budista.
Kimanhê falava bem inglês e fico sabendo pelos 19 km de caminhada que ele é um estudante de direito. Está no quarto ano. Falta mais um. Sim ele sabe de tudo. E sua desconfiança do sistema parece mais fundamentada.
Ele me explica que escolheu estudar a distância. Dois meses a cada ano vai à universidade e depois apenas tem que mandar cartas. Achei bem útil esse sistema.
Contou que muitas leis estão mudando e eu disse que isso devia anima-lo pois os advogados do passado vão estar ultra-atrapassadissimos. Ele se formava nos tempos novos. Ele ficou feliz.
Explicou da confusão que havia com uma província na fronteira com Bangladesh. Tem vontade de conhecer o Nepal.
Me ensinou mil coisas na língua de Burma.
“Myanmar Lo Kiotéla. Nenê”
Mais ou menos não sei falar a língua de Myanmar, só um pouquinho 🙂
Ele me mostrou um lugar que tinha agrotóxicos e não eram vegetais orgânicos. Contou que não bebe, não fuma, não come tabaco porque tudo isso destrói a sua saúde.
Contou que no campo as casas colocam o banheiro para fora da casa. Ele prefere assim. Viver no campo.
Eu fiquei maravilhada quando perguntei da Banana flambada que tinha comido. Ele me explicou.
“Queimada com álcool e mel. É um prato típico daqui.”
Adorei porque tinha adorado ontem e pensava que era só em lugar de turistas. Ele me explicou que sua mãe sempre faz.
Ele é sobrinho do dono da agência Green Discovery. E o tio é neto de um inglês que já faleceu e portanto o tio que conheci hoje fala inglês perfeito.
A única coisa triste do dia foi ficar sabendo que que Kimannhê ( que se escreve diferente , e eu coloco assim para lembrar como se pronuncia) parte hoje para uma outra cidade. Portanto resolvi amanhã ficar aqui e depois de amanhã ir ao lugar que ele me disse que era bonito e eu teria que ir com um outro guia.
Por agora me sinto perfeita. Nem se quer fiquei ainda cansada. Amanhã já aprendi onde fica o lugar da massagem. Isso que eu farei! Já que meu hotel está pago até dia 14. Dia 13 outra caminhada e no 14 vou para Inle Lake.
Enquanto andava uma hora senti o exato lugar que entraram no meu corpo para fazer a angiograma. Na minha virilha direita. Senti e pensei no meu amigo Francisco da escalada.
Francisco me disse uma vez que ele tinha esclerose múltipla e que se eu tivesse não deveria ficar apavorada. Sei que uma parte minha ficou.
Depois um dia ele me contou que ter esclerose múltipla o fazia fazer escalada todos os dias. Ficar parado é privilégio para quem nao tem nada. Um dia parado e tudo se estagnava nele. De uma certa forma hoje quando senti a veia por onde entraram no meu corpo eu entendi acho que melhor o Francisco.
Quando não temos certeza do amanhã vivemos o dia de hoje plenamente. E na verdade ninguém devia não fazê-lo. E muitos se prendem pelo medo da coisa mais comum que há: a impermanência de tudo na nossa vida.
Então Francisco eu te agradeço hoje. No final a sua esclerose e a minha vasculite cerebral nos libertou. Desejo a todos que se libertem de medos e das inseguranças que são 90% do tempo desnecessárias. Eu agradeço a todos porque me sinto tão viva. Tão bem. Tão privilegiada. Que só posso agradecer.
Com amor, Ju