Dias desses, eu vi um vídeo sobre o fato de que esse tempo que estamos vivendo é de alto vício a internet, ao telefone, ao facebook, whatsapp, e isso me tocou.
Já sabia. Mas me fez lembrar de uma amiga que tem um restaurante e de que ela tinha me contado algo. Sempre faço perguntas.
Sempre pergunto as pessoas o que as tocam.
Minha amiga disse que para ela, era ver pessoas que iam ao restaurante e que todos ficavam no telefone. Aquele dia decidi que ia tentar sair disso.
Tenho visto que é considerado uma doença, um vício e que tantos jovens estão doentes. Estão sempre fora do presente.
Resolvi não usar telefone por 3 dias, e então percebi que é verdade. Estou viciada no telefone e tentando me libertar.
Portanto estou eu aqui tentando escrever. Do segundo em que comecei tive que olhar para o presente. Como é duro estar presente!
Eu estive em coma duas vezes. Já tive as perdas, e até no coma estamos nos deslocando.
Lembro do meu último coma, e desde que eu passei por ele, todos os países no qual estive estão meio misturados. Me toca, pois lembro do lugar da música que apesar de eu saber que existe não sei onde.
O cérebro é algo muito complicado. Nesse meu tempo buscando estar no presente vejo minha avó lendo, e o André também. Porque será que ler, dançar e outras coisas do gênero não são consideradas vício?
Lembro-me que uma vez fui fazer Vipassana. Já que minha mente não está com boa memoria e tento não usar internet, escrevo do que me lembro…
Aprendi que fazer Vipassana era comum entre os Budistas e que é para conhecer a realidade e estar presente.
Pelos mistérios da vida eu fui à Índia, conheci e tive ensinamento com o Dalai Lama. O Dalai Lama nunca pede para ninguém ser Budista. Ele diz que é mais fácil não mudar de religião, e que se pode pegar do budismo o que fizesse sentido .
Conheci a Denise na Índia e fui com ela conhecer o Karmapa. Eu não sabia quem era ele, mas aprendi que era considerado HH (his holiness) como Dalai Lama. HH é muito importante para os Tibetanos. Fui sem saber, achando que era um encontro com muitas pessoas. Denise com a Rita, me levaram a um encontro privado. Eu, ateia tentei aprender e ser educada, fazer as coisas corretas.
Denise me lembrou esses dias que o Karmapa conversou diretamente por um longo tempo comigo e disse que eu ficaria bem e que ele estaria sempre comigo. Eu a ateia na hora não me toquei. Isso anos antes do meu primeiro Coma.
Karmapa á algum tempo atrás declarou que esteve deprimido . Minha admiração por ele por aceitar demonstrar nossa humanidade em comum me fez aumentar ainda mais a admiração por ele.
Via a Denise, conheci Lama Lobsang Dargye , que ensinava budismo na Europa e virou meu amigo. Quando estou quase indo para o retiro de Vipassana recebo as explicações de como seria. Eu já tinha me inscrito umas 9 vezes e cancelado por medo.
Não poderia ficar uns 10 dias sem telefone. Sem falar, comendo pouco, podendo apenas meditar, andar. Eu sempre me inscrevia e cancelava.
Quando fiquei amiga do Lama Lobsang , mais uma vez eu tinha feito a inscrição para esse retiro e mais uma vez estava desesperada. E ao encontrar o Lama Lobsang , esperava que ele me dissesse palavras boas de motivação e incentivo para fazer o retiro de vipassana, para minha surpresa ouvi o oposto:
“ É duro e difícil, não é fácil , é duro estar presente. Ou seja vá!”
Esse é Lama Lobsang meu amigo, Lama Tibetano que já partiu da terra.
Lama Lobsang me ensinou tantas coisas e graças a minha amiga Denise, que me deu tudo isso, também me disse que eu devia escrever.
É verdade que eu aprendi muito pelo mundo e o mais duro é estar presente.
No retiro de Vipassana , la pelo terceiro dia eu quis partir. Vou falar e explicar. Decidi deixar o retiro e fui conversar com uma senhora da organização. Disse tudo de filosofia, antropologia política que sabia para essa senhora. Explico todas as razões do mundo que haveria para justificar minha partida. Ela não diz nada. Eu penso que talvez ela seja burra, não educada, coloco tudo que havia para ser dito e ela se manteve em silencio e me diz apenas: “ É duro estar presente.”
Me lembro que aquilo me fez quase cair. Por orgulho decidi que ia ficar, para provar no final que era fácil. Como foram duros os dias!
E de repente eu comecei a ver as flores que caíam. As que nasciam. Eu dividia o quarto com uma moça e fiquei menstruada, tive cólica e sem dizer nada a menina do lado deixa de forma natural um remédio para cólica. Aquilo me tocou muito. Não havia reclamações, estávamos presentes.
Ficamos até o fim, e vimos tudo que se passava com o outro. Pessoas de várias idades. Em silêncio dava para ver quão duro era, e variava o nível de dificuldade de um para o outro. No final as pessoas foram liberadas para começar a falar e nos abraçamos, e eu podendo falar fiquei em silencio por profunda admiração. Você pode imaginar que então ficou fácil.
Quando voltei para o Brasil fui fazer o retiro de Vipassana novamente e parti. Me contei que era de uma qualidade pior. Hoje me dou conta que aquilo foi mais uma vez uma fuga de estar presente.
Acharam que meu coma foi devido á epilepsia e por anos tentaram descobrir porque? Hoje dizem que é encefalite autoimune.Escrevo tudo isso porque tento não usar a internet. E o que acontece? Volto ao presente. É duro mas vale muito.